Neste fim de semana, foram várias as análises suscitadas pela forma como se fez a apresentação da candidatura de Cavaco. Um dos aspectos mais referidos foi o facto de ele aparecer como há vinte anos, quando conquistou o PSD para depois governar o País durante dez anos, com uma aura de "político não profissional" ou de "político relutante" na feliz expressão de Vicente Jorge Silva, no DN, retomada por Mário Mesquita, no Público de domingo. "A relutância à política surge como herança histórica do salazarismo. Nesta versão, a política é uma actividade pouco dignificante que só pode redimir-se quando exercida por professores virtuosos, sábios e castos", escreve Mário Mesquita. Cavaco, que é um dos políticos que mais tempo exerceu o poder, e o primeiro-ministro que, primeiro e durante mais tempo, dispôs de uma maioria absoluta, não consegue, passado este longo período de recuo, fazer a inscrição da política na sua vida e no seu percurso de uma forma natural. Necessita de enfatizar a distância que o separa desse mundo da política profissional, mesquinha, impura, partidária. Recordemos José Gil que escreveu que " vida social portuguesa, agora pacificada [ pós 25 de Abril], viu a não-inscrição reassumir os seus privilégios em todo o seu esplendor".
Outra questão que se relaciona com a relutância é a questão dos debates. Cavaco destacou-se durante o longo período em que governou o País, nas diversas vezes em que disputou eleições, inclusive eleições presidenciais, por ser avesso aos debates. Nos útimos dias apareceram notícias que davam conta da disponibilidade, não inocente, de Mário Soares para realizar o maior número de debates com todos os candidatos. Mário Mesquita pega nesta questão para recordar não só a recusa de Cavaco de debater com Jorge Sampaio, nas legislativas de 1991, mas também a tão atribulada relação com as "forças de bloqueio" .
Esta recusa dos debates é entendida como uma manifestação da atitude relutante em relação à política e em particular à política democrática. Há no entanto quem argumente - aqui e aqui- com diferentes posicionamentos de outros protagonistas, incluindo Soares, relativamente aos debates, muito ditados pelo grau de popularidade com que os candidatos se apresentam numa eleição específica. Nesse sentido Cavaco gozará de uma situação que o aconselha a diminuir, ao máximo, a sua participação em debates. Como fez em 1991, contra Jorge Sampaio, com os resultados e as consequências que se conhecem. Curiosamente a retumbante vitória então alcançada permitiu a Guterres conquistar o PS e a Samapaio suceder a Soares, derrotando....Cavaco.


 

Pedra do Homem, 2007



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