Afterglow

É sempre comovente o pôr do Sol
por indigente ou berrante que seja,
mas ainda bem mais comovedor
é o brilho desesperado e derradeiro
que enferruja a planície
quando o último sol ficou submerso.
Dói-nos reter essa luz tensa e clara,
essa alucinação que impõe ao espaço
o medo unânime da sombra
e que pára de súbito
quando notamos como é falsa,
quando acabam os sonhos,
quando sabemos que sonhamos.


Jorge Luis Borges

Este é um dos poemas de 'Fervor de Buenos Aires', obra de 1923 considerada o primeiro livro de Jorge Luis Borges. Chegado a ele, sensivelmente a meio do livro, é difícil ter-se a noção do que prende e encanta a nossa atenção: se as palavras de Borges, se a sua Buenos Aires, descrita por versos que fogem do papel e edificam, eles próprios, uma cidade, a sua cidade. Caminhos, ruas, praças, bairros e sombras. Nestes poemas, nada disto são palavras; são já lugares que nos pertencem.


 

Pedra do Homem, 2007



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