confesso que sempre simpatizei com Rui Rio. Devo aliás reafirmar que a sua vitória nas autárquicas em que derrotou Fernando Gomes me agradou sem reservas. Ter derrotado a ligação espúria entre política e futebol que o PS-Porto e o FCP de Pinto da Costa corporizavam, foi um dos grandes feitos da democracia local. Ter colocado a luta contra a corrupção na ordem do dia, foi uma temeridade que acabou - como explicou Saldanha Sanchez num artigo do Expresso que aqui referi - com o próprio a ser alvo da justiça, que tão grande desaforo não podia passar impune.
No passado recente Rui Rio cometeu dois grandes crimes: em primeiro lugar quis fazer depender a atribuição de subsídios pela autarquia a orgãos de comunicação do compromisso escrito de não atacarem a autarquia. Quis colocar por escrito aquilo que é uma regra em todo o país. Nas autarquias de todos os partidos. As câmaras só compram publicidade se as rádios e os jornais não fizerem muitas ondas. Por essa razão os jornais locais são o que são e as rádios idem aspas, aspas aspas. Os projectos verdadeiramente independentes fecharam. Entre os autarcas não há rapazes bons nesta matéria. Rui Rio cometeu o erro de colocar a coisa por escrito. Dar à prática corrente a dignidade de um contrato. Caíram-lhe em cima como se fosse o único. Hipocrísia em doses elevadas; em segundo lugar, farto da conflitualidade com os sectores da cultura, resolveu cortar os subsídios que a câmara atribuia. Caiu o Carmo e a Trindade. Não acho a medida razoável e julgo que Rui Rio irá ceder nesta matéria.
Existindo responsabilidades públicas na promoção da cultura e das artes, e as autarquias não podendo nem devendo alhear-se desse esforço, há um aspecto que quero referir. Uma das imagens de marca do nosso atraso é a demissão da cidadania. Nessa matéria os ditos agentes culturais, que os há em todas as autarquias, dão uma triste imagem. Pautam a sua intervenção cidadã pelo silêncio e pela não participação. Constituem-se como um grupo social especializado que paira acima da massa popular e quando desce à terra em beberetes, e inaugurações o faz para abrilhantar, com a sua presença, a presença opaca e cinzenta do poder. Actuam como se tivessem interiorizado a máxima salazarista de quem tendo negócios na cidade coloca como condição de sensatez e factor potenciador do sucesso futuro o silêncio e a reverência perante o poder político.Este comportamento é estimulado. Recordo,aliás, que a relação de todas as autarquias - incluindo as geridas pela esquerda que muito criticam Rui Rio, como acontece no Porto com a CDU - é a de cortarem subsídios e asfixiarem economicamente associações cujos dirigentes tenham divergido da "política cultural" da maioria ou, crime inaceitável, tenham ousado participar em eleições integrando listas concorrentes. Existem em Portugal um número assinalável de "casos de estudo".
Rui Rio não quererá agentes culturais mais capazes de intervir na polis. Não será esse o objectivo da sua medida, mas poderá ser um dos efeitos colaterais.
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