A novidade
Que tem no Brejo da Cruz
É a criançada
Se alimentar de luz

Alucinados
Meninos ficando azuis
E desencarnando
Lá no Brejo da Cruz

Electrizados
Cruzam os céus do Brasil
Na rodoviária
Assumem formas mil

Uns vendem fumo
Tem uns que viram Jesus
Muito sanfoneiro
Cego tocando blues

Uns têm saudade
E dançam maracatus
Uns atiram pedra
Outros passeiam nus

Mas há milhões desses seres
Que se disfarçam tão bem
Que ninguém pergunta
De onde essa gente vem

São jardineiros
Guardas noturnos, casais
São passageiros
Bombeiros e babás

Já nem se lembram
Que existe um Brejo da Cruz
Que eram crianças
E que comiam luz

São faxineiros
Balançam nas construções
São bilheteiras
Baleiros e garçons

Já nem se lembram
Que existe um Brejo da Cruz
Que eram crianças
E que comiam luz

Chico Buarque, 1984


 

Pedra do Homem, 2007



View My Stats