Sócrates agradeceu aos portugueses por o terem ajudado a controlar o défice que já desceu para os 3%, pasme-se. Este milagre - que Sócrates espera o coloque, depois de 2009, por mais quatro anos com a faca e o queijo na mão - da gestão socialista merece as mais variadas críticas quanto à forma como foi conseguida. Mas se alguém tem dúvidas sobre o notável feito leia aqui que todas as dúvidas se dissiparão. Para alguma coisa servirão os chamados intelectuais orgânicos do socratismo.
Eu que me recordo do que Sócrates dizia na camapanha eleitoral que o elegeu e de como manifestava a sua sensibilidade e preocupação com o crescimento do desemprego e de como acusava, justamente, o PSD de insensibilidade face a esse drama crescente, espanta-me que nada diga agora sobre o crescente desemprego que parece a consequência das políticas que o conduzem ao resultado que tanto orgulho lhe provoca.
Recorrendo a um livro de Stiglitz, Os Loucos anos 90 - A década mais próspera do Mundo, e ao prefácio de Jorge Sampaio destaco as seguintes frases:
"(...) Entre os mitos analisados ( e desmontados) pelo prof. Stiglitz ao longo do livro (...) estão as ideias feitas de que:
- a redução do défice orçamental foi o motor da recuperação económica - quando a teoria e a práctica mostram que a diminuição do défice não relança a economia, questão a que, pela sua relevância para a Europa e para Portugal, também dedicarei adiante alguma atenção;(...) A nova explicação [ para a relação entre o combate ao défice e o desenvolvimento económico a partir da bem sucedida experiência americana de 1992] assenta essencialmente na confiança: A diminuição do défice público aumentaria a confiança dos banqueiros e investidores e assim tranquilizadas, as empresas voltavam a investir no crescimento e na inovação, os consumidors começaram a gastar outra vez e a recuperação ganhou impulso. O programa dos falcões do défice era claro: manter os défices baixos (mesmo nas recessões) e ouvir o que os mercados financeiros queriam (...) A análise da redução do défice orçamental na década de 90 é importante para os países da Zona Euro, cujas políticas orçamentais têm estado condicionadas pelo Pacto de Estabilidade e, subjacentemente , pelo mito de que a austeridade orçamental, especialmente pela diminuição das despesas públicas, aumentaria a confiança dos agentes económicos e o crescimento da economia viria por acréscimo. Seria bom, mas não é inteiramente verdade. A amarga experiência económica dos últimos anos, na Zona Euro e em Portugal, mostra que as coisas não se passaram assim (...)"
Este prefácio de Jorge Sampaio foi escrito em Fevereiro de 2005. Passados mais de dois anos podemos concluir que, tal como então, as coisas continuam a não se passar assim. O controlo do défice melhorou, o discurso político, sobretudo de Sócrates, centrado na confiança -nunca nenhum primeiro-ministro utilizou tanto esta palavra - repete-se até à exaustão mas a retoma económica jaz e arrefece. O desemprego, esse sim, não para de aumentar. Sócrates consegue a taxa de desemprego mais elevada da Zona Euros e a mais elevada em Portugal desde a adesão à UE. É obra.
Os desempregados são as vitimas maiores deste tipo de políticas neoliberais que conduzem hoje os destinos de Portugal e da UE. Políticas que foram beber ao espírito do Consenso de Washington. Volto a Stiglitz e a outro livro(*) para citar : " A austeridade orçamental, as privatizações e a liberalização dos mercados foram os três pilares do Consenso de Washington nos anos 80 e 90." São elas que hoje estão na base do Pacto de Estabilidade e Convergência e das políticas que liquidam, todos os dias, o ideal europeu.

(*) - Joseph Stiglitz. Globalização. A Grande desilusão. Edição Terramar.


 

Pedra do Homem, 2007



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