Não estou certo que a ideia de Vital Moreira de bonificar transitoriamente os juros dos empréstimos para aquisição de casa própria das famílias com menores rendimentos seja a melhor solução para limitar os encargos que essas famílais suportam e que lhes consome uma cada vez maior parte do seu rendimento. Mas a solução não é certamente nada fazer e assisitir impávido e sereno à ruína de dezenas de milhares de famílias com a perda das suas casas e com a dissolução das respectivas famílias, com consequencias dramáticas a longo prazo.

Argumentar como aqui partindo do pressuposto de que os necessitados do apoio preconizado por VM são-no por força de uma sua irresponsabilidade, que por esta via seria premiada , é fruto, além de um elevado cinismo, de uma completa desonestidade intelectual. Ou talvez não seja mais do que uma manifestação de uma profunda ignorância sobre esta questão. Não será ignorante quem acha que em Portugal nos últimos 20 anos a compra de casa se colocou no campo das opções que cada um toma de per si, livremente; quem acha que quem optou por comprar casa tinha sempre a opção de arrendar casa; quem não sabe que o empréstimo com juro variável já comia a totalidade do rendimento disponível e que essas pessoas não tinham condições económicas para optar, livremente, por taxas de juro fixo; quem acha que a opção entre habitar em casa própria ou permanecer na casa dos pais, dependia apenas e só de se querer ser solidário, ou não, para com eles; quem acha que a proposta de VM beneficiaria os que ficaram com uma dívida avultada por terem adquirido uma casa gande situada numa rua boa e cara em detrimento daqueles que decidiram ir morar num bairro mais baratinho, não sabe em que País vive e daquilo de que está a falar.

Portugal tem uma das maiores taxas de proprietários da UE e na relação nº de proprietários(75%) / PIB per capita, a mais desiquilibrada de todas. Portugal é o país da Europa em que o mercado de arrendamento tem menor expressão, podendo mesmo falar-se em inexistência desse importante mercado o que faz com que a compra da casa se coloque no campo das puras inevitabilidades. Quem compra casa, sobretudo aqueles que são mais afectados pela actual situação, não tinha condições para ficar a viver em casa dos pais, porque, entre outras razões, eram paupérrimas as suas condições de habitabilidade. Será que alguém desconhece a evolução verificada no parque habitacional nos últimos 30 anos?
Viver em casas grandes não se aplica aos portugueses, em particular aos necessitados de auxílio, pois Portugal é o país da UE em que a área útil de habitação por pessoa é a mais baixa dos países mais desenvolvidos e a mais baixa da Europa, menos de metade da Dinamarca, da Suécia e pouco mais de metade da área da Holanda ou da Alemanha. Estamos a falar em valores médios o que dá uma ideia assustadora do que se passa nos extractos mais baixos. Portugal é, aliás, o país da UE em que há mais tempo um maior número de famílias vive numa situação de "carência habitacional real". Eram 705 mil famílias nos Censos de 1991, continuaram a ser 748 mil famílias no censo de 2001.
Por isso acho que a proposta de VM faz todo o sentido para actuar numa situação de emergência. Existem outras medidas complementares que podem ser implementadas sempre com a perspectiva de ocorrer aos mais necessitados, limitando a voracidade, agora ampliada, dos bancos e controlando a variabilidade da taxa. Mas aquilo que faz mesmo falta é uma política de habitação em que o Estado passe a ter uma capacidade de determinar a oferta em função das necessidades da procura isto é das necessidades dos diferentes grupos sociais. Só se pode fazer com política urbanísticas que conjuguem o desenvolvimento urbano com políticas públicas de habitação e que obrigue os planos urbanísticos a concretizarem planos locais de habitação. Mas sem o controlo e a socialização das mais-valias urbanísticas não se conseguirá nada de relevante, apenas paliativos.


 

Pedra do Homem, 2007



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