O artigo de Medina Carreira, aqui referido, foi publicado exactamente dois dias antes de o professor aparecer publicamente como mandatário distrital da candidatura de Cavaco Silva, o que não deixa de ser uma ironia. É que Cavaco é, certamente, de todos os possíveis candidatos à direita aquele que se aproxima mais da social-democracia. Cavaco que, no seu manifesto, afirmou saber "bem como as políticas públicas são importantes para o regresso da economia portuguesa à trajectória de convergência sustentada com a Europa(p.6)" , ou que "(...)importa discutir o papel do Estado (...)sem que isso signifique confiná-lo às funções de soberania e de regulação e fiscalização, nem monesprezar a importância da função redistributiva, de corrector das falhas de mercado e de promotor da igualdade de oportunidades (p.7)", ou ainda que " não me conformo com a percentagem relativamente elevada de portugueses que não dispõem de rendimentos para poderem usufruir de condições de vida com o mínimo de dignidade(p.12)"
Medina Carreira está, desde há uns anos, incompatibilizado com a esquerda socialista, área política na qual sempre se situou, tanto quanto me lembro. A coisa agudizou-se depois de Guterres ter metido na gaveta a reforma fiscal que o professor preparou, durante os Estados Gerais, com a colaboração de outros notáveis dessa área. Foi um erro enorme de Guterres. A reforma era boa e necessária e era uma reforma justa. Ainda hoje não temos nada que se compare. Guterres faltou à sua palavra e Medina Carreira nunca mais se recompôs. Ainda hoje é recorrente a sua referência à necessidade de haver coragem e verdade na política. No entanto a sua capacidade crítica já se manifestara no início da década de noventa, quando criticava as políticas fiscais que o então ministro das Finanças de Cavaco Silva, Miguel Cadilhe, tentava implementar. Em particular o famigerado regime de "transparência fiscal" que permitia, segundo o professor, acentuar a evasão fiscal. Depois do trauma Guterres, apoiou Durão, que fez o que fez, e Manuela Ferreira Leite, que nunca diminuiu a despesa pública, apesar da venda de património ao desbarato, tendo conduzido o país até ao défice de 6,8%.
Nos últimos meses tem anunciado que o País é inviável a continuar este caminho. Caso para dizer que, apesar do manifesto exagero da afirmação, Medina Carreira não deixa, lá por isso, de ser uma das vozes mais lúcidas da nossa cena política. Apoie ele quem apoiar.
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