O texto da Maria José Botelho levanta algumas das questões pertinentes que se colocam hoje na relação entre a arquitectura enquanto coisa pública, já que de outra qualquer perspectiva o assunto é bastante irrelevante, e a polis.
Questões que o círculo de poder - dos vários poderes mesmo os que entre si conflituam - recusa discutir agora que descobriu que a arquitectura, sobretudo aquela que é susceptível de transportar no dorso o carácter distintivo da monumentalidade e mesmo da obra de arte moderna, seja lá isso o que fôr, pode permitir disfarçar programas políticos de intervenção na cidade mediocres, reaccionários, retrógados, desprovidos da mais elementar ideia por muito elementar que seja.
O mundo move-se muitas vezes assim, com sucessivos regressos ao passado. Recorde-se a utilização que Mussolini fez da monumentalidade na arquitectura e a relação entre Albert Speer, um dos maiores arquitectos alemães, e Hitler. Já com o ditador nazi desesperado, no bunker onde se suicidou, Speer foi-lhe mostrar a maquete da reconstrução de Berlim. Recorde-se num passado mais recente a forma como Miterrand utilizou a arquitectura para deixar, sobretudo, a sua marca impressa no tempo. A arquitectura tornou-se instrumental dos projectos de poder pessoal e de tentativa de assegurar um lugar na posteridade. Recebe em troca um farto saco de moedas.
Nestes tempos pouco interessantes com um pequeno lugar para a capacidade crítica e a discussão de ideias a Arquitectura coloca-se ao conjunto dos cidadãos como uma fatalidade e nunca como uma escolha. Numa recuperação do espírito salazarista, que nunca nos abandonou, devemos talvez proclamar: felizes de nós tão ignaros que temos pessoas tão inteligentes e sensíveis capazes de pensar, decidir e fazer por nós.
( a continuar).


 

Pedra do Homem, 2007



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