Existem parques e parques. Alguns deles, acompanham o tecido urbano no qual se inserem e disfrutam de uma presença constante na Grande e pequena Historia. França é um desses países onde “passar pelo jardim” é algo acessível a todos. Em cidades como Paris (mas não só), passar pelo jardim não significa exclusivamente ter uma vivenda com espaço. Em Paris vive-se a cidade.
O Jardim do Luxemburgo, em pleno coração da capital francesa, faz esse papel de pulmão urbano num dos bairros mais bonitos da cidade. Apesar da elegância incontestável do sixième, este não escapa às consequências de ser visitado por centenas de carros todas as manhãs. Mas o Luxembourg não se importa. Prefere exalar clorofila. Tão boa disposição só poderia culminar num bocadinho de natureza pronto a acolher quem quer estar calmo, fazer desporto, ou simplesmente ver os outros ( os que estão calmos ou os que fazem desporto). Sabemos que é algo inevitável, mas o Jardim do Luxemburgo é mais do que um simples parque.
O Luxemburgo não é apenas um parque graças ao Senado francês e à sua administração que o mantém como um autêntico museu ao ar livre. A fonte de Médicis, as estátuas e o jardim, assim como um conjunto de colméias deixam-nos com a sensação de viver um autêntico cliché Belle Epoque. O jardim é ainda palco para o Ténis, para as brincadeiras na areia, para os baloiços, o café e para as decisões politicas da nação! É berço de História. E o charme de outrora resiste ao tempo.
Fruto da nostalgia de Maria de Medicis, o Jardim sofreu das ânsias urbanísticas do arquitecto Haussman. A primeira desejara recreear o ambiente florentino dos Jardins de Boboni. Mais tarde, a reorganização urbanística da cidade impôs-se. O jardim botânico foi eliminado para permitir a abertura do Boulevard Saint Germain e da Rua Vaugirard ( uma das mais longas da cidade). Foi posteriormente local de acolhimento aos feridos da guerra do Rhin em 1870. Ao sabor dos caprichos do poder de cada época, o Jardim era mais ou menos acessível ao público. Os traços da ocupação nazi fizeram-se sentir no início do século passado, mas entre 19 e 25 de Agosto de 1944, as forças victoriosas eliminaram os traços da ocupação. As estatuas ficaram. Hemingway perseguiu pombos. Jean Paul e Simone conversaram. E os todos os outros continuam a conversar nos nossos dias.
Uma senhora delgada, vestida com uma fazenda cor terra carrega alguns jornais e faz-se acompanhar por um Basset Hound indiferente a tudo, apenas interessado no que o seu olfacto lhe permite investigar. O cão parece feito de um veludo negro, muito brilhante, que alguém se encarrega de tratar todos os dias. Dirige-se a senhora em direcção à porta principal, na qual podemos contemplar o Panteão. Sou abordado inesperadamente por uma energeticas passadas na areia grossa do parque. Dois jovens adultos, com os respectivos Ipods de serviço, queimam calorias antes de começar o dia. Apenas chegamos às nove horas da manhã. Ao longe, em diversas direcções e como abelhas, homens de negros fatos, malas ao punho, gravatas obrigatorias. Tão diferentes dos meninos do Jardim de Infância que, como uma bola de energia, quebram a atrmosfera de pássaros e plantas até então dominante. Um último detalhe relativamente ao Luxemburgo. Há uns dias perguntei a um polícia a que horas fecharia o Jardim. Repondeu-me: “Quando o sol se põe, jeunne homme. Quando o sol se põe.”

António Oliveira e Silva

Texto recebido por e-mail


 

Pedra do Homem, 2007



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