"Experimenta ir de Copenhaga a Estocolmo de comboio. Comprado o bilhete, dás contigo num comboio que só se diferencia dos nossos Alfa por ser menos luxuoso e dotado de menos serviços de apoio aos passageiros. A viagem, através de florestas geladas e planícies brancas a perder de vista, demorou cerca de cinco horas.
Não fora ser crítico do projecto TGV e conhecer a realidade económica e social desses países, daria comigo a pensar que os nórdicos, emblemas únicos dos superavites orçamentais, seriam mesmo uns tontos. Se não os conhecesse bem perguntaria onde gastam eles os abundantes recursos resultantes da substantiva criação de riqueza
A resposta está na excelência das suas escolas, na qualidade do seu Ensino Superior, nos seus museus e escolas de arte, nas creches e jardins-de-infância em cada esquina, nas políticas pró-activas de apoio à terceira idade. Percebe-se bem porque não construíram estádios de futebol desnecessários, porque não constroem aeroportos em cima de pântanos, nem optam por ter comboios supersónicos que só agradam a meia dúzia de multinacionais.
O TGV é um transporte adaptado a países de dimensão continental, extensos, onde o comboio rápido é, numa perspectiva de tempo de viagem/custo por passageiro, competitivo com o transporte aéreo.
É por isso, para além da já referida pressão de certos grupos que fornecem essas tecnologias, que existe TGV em França ou Espanha (com pequenas extensões a países vizinhos). É por razões de sensatez que não o encontramos na Noruega, na Suécia, na Holanda e em muitos outros países ricos. Tirar 20 ou 30 minutos ao Lisboa-Porto à custa de um investimento de cerca de 7,5 mil milhões de euros não trará qualquer benefício à economia do País. Para além de que, dado hoje ser um projecto praticamente não financiado pela União Europeia, ser um presente envenenado para várias gerações de portugueses que, com mais ou menos engenharia financeira, o vão ter de pagar.
Com 7,5 mil milhões de euros podem construir-se mil escolas Básicas e Secundárias de primeiríssimo mundo que substituam as mais de cinco mil obsoletas e subdimensionadas existentes (a 2,5 milhões de euros cada uma), mais mil creches inexistentes (a 1 milhão de euros cada uma), mais mil centros de dia para os nossos idosos (a 1 milhão de euros cada um).
Ainda sobrariam cerca de 3,5 mil milhões de euros para aplicar em muitas outras carências, como a urgente reabilitação de toda a degradada rede viária secundária.
"

Comandante João Carvalho

Comentário - Sou dos que penso que a ligaçao por TGV ente Lisboa e Porto é uma obra inadmissível para um país que tem os níveis de pobreza do nosso e que presta aos seus cidadãos serviços, em muitos casos, de uma qualidade sofrível. Trata-se de um investimento brutal para permitir - se tudo correr bem, o que em regra não acontece - poupar 30(!!!) minutos no trajecto entre as duas cidades. A coisa tem uma explicação no domínio da competitividade desta grande área metropolitana que poderia por via dessa enorme concentração de recursos ser competitiva á escala europeia.
Não concordo com esta visão já que me parece que um dos problemas do país é a sua hipertrofia numa faixa entre Braga e Setúbal e que não ganhamos nada deitando mais gasolina para cima da fogueira.
Defendo no entanto o TGV entre Lisboa e Madrid por se integrar numa lógica das grandes redes europeias e porque a sua não construção acentuará o nosso carácter periférico já que a verdadeira distãncia entre dois pontos mede-se em tempo.
Um dos nossos problemas é que temos espatifado os fundos europeus -ditos da coesão - em obras faraónicas que pouco ou nada acrescentaram à nossa competitividade - os estadios de futebol, foi um caso de polícia que como é costume não levou ninguém à cadeia - que continua pelas ruas da amargura, e não aproveitámos esses recursos irrepetíveis a dezenas de anos de distância para modernizarmos o país em áreas decisivas para o futuro. Veja-se como este Governo não se cansa de anunciar mais escolas básicas, mais creches mais isto e mais aquilo para 2012, 2015 e 2020.


 

Pedra do Homem, 2007



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