"Sardinha fica sete vezes mais cara entre a lota e o mercado"
Como já sabemos há muitos anos uma das consequências da nossa entrada para a comunidade foi passarmos a ficar obrigados a cumprir um conjunto de regras de concorrência que, em tese, visam a defesa dos superiores interesses dos consumidores. Uma dessas regras impôs que a taxa de intermediação - julgo que é assim que se chamava - que era fixa e da ordem dos 10% fosse abolida. O preço do peixe vendido na lota e adquirido pelos intermediários era vendido aos consumidores finais com um preço que não podia ultrapasar em 10% esse valor de venda. A liberalização visou permitir em função das condições da oferta e da procura, se possível, diminuir aquela margem.
Como é obvio nada disso aconteceu. O sistema de concorrrência implantado na UE não protege, muitas vezes - a constatação de um facto - os consumidores. O peixe passou a chegar ao consumidor final cada vez mais caro. O pescador passou a vender o peixe cada vez mais barato.
A classe que enriqueceu à custa deste esquema foi a dos intermediários. Passou a ser possível comprar a cem e vender a mil. A perda de poder de compra dos pescadores neste período foi brutal, penalizando sobretudo os pequenos armadores da pesca local, arruinados em muitos casos, incapazes de manter as explorações face à crescente diminuição do preço do pescado em lota, à subida dos custos de produção e à incapacidade de competir com outras procuras de mão-de-obra.
Quem entendeu desde logo todo este mecanismo e o sabia explicar muito melhor do que eu alguma vez serei, era o João Carlos Almeida, o nosso amigo João "Fortúnio" - infelizmente morto em condições trágicas - um pescador, o mais importante dirigente do movimento associativo dos pescadores português, desde o 25 de Abril, e um dos homens mais inteligentes e conhecedores que tive o previlégio de conhecer. Como ele se riria se pudesse ler a notícia do Público de hoje a dar novas notícias velhas de anos e anos a penar.

Um destes dias ainda vou editar um notável conjunto de entrevistas que ele deu ao jornal Sudoeste. Ninguém sabia tanto de pescas, e de muitas outras coisas, neste país.


 

Pedra do Homem, 2007



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