José Manuel Fernandes, a propósito dos tumultos em França, escreve, hoje no Editorial do Público, que " o fracasso da "integração" reside nos equívocos do politicamente correcto e na total confusão dos valores." Partindo de uma análise, que subscrevo, aos equívocos da governação "errática" do Presidente Chirac, José Manuel Fernandes acaba por chegar à paradoxal conclusão de que o problema está não nos guetos, em que se tornaram os chamados bairros sociais, mas na atitude dos que "ficaram para trás, queixando-se, desistindo, aceitando a marginalidade e convivendo com ela." Esses são afinal, segundo o jornalista, os responsáveis por oposição aos que partiram fazendo pela vida.
O problema não é esse. Na sociedade francesa desde há pelo menos uma década decorre um aceso debate sobre as questões da segregação espacial das populações de menores recursos e dos imigrantes. Tem decorrido um forte debate sobre os mecanismos da segregação espacial dessas populações e existe um largo consenso na comunidade técnica e científica sobre a importância dos mecanismos fundiários nessa segregação.
Quando a segregação adquire o estatuto de fragmentação urbana com os condomínios privados e a segurança urbana privada o inevitável acontece com as manifestações de violência dos excluídos. A tendência para a agregação social das elites, a oferta dos promotores imobiliários orientada para o monoproduto imobiliário, socialmente segregado, a segregação induzida pelo zonamento e por leis urbanísticas que optaram por excluir ou por concentrar os alojamentos sociais, revelaram-se mais fortes do que as medidas correctivas adoptadas como a Lei de Orientação para as Cidades (LOV) e a Lei de Solidariedade e Renovação Urbana (SRU).
A situação francesa é consequência da adopção de políticas liberais promovidas pela direita, mas igualmente pelos socialistas, que se revelaram incapazes de lidar com a dimensão dos problemas que criaram. As questões urbanas são demasiado complexas para poderem ser subordinadas aos interesses da iniciativa privada. A vida urbana não é um produto nem os cidadãos são apenas consumidores.
Nada disto resulta do modelo social europeu antes pelo contrário traduz a falência de um modelo que tem hegemonizado as práticas políticas dos governos europeus, que acentua as desigualdades e promove, desde há décadas, num processo lento mas inexorável a eliminação desse modelo.
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