Fotografia retirada do site bl-out.com

Um descampado e lá estão eles: os palcos. Os palcos, as tendas gigantes da logística, os WC colocados estrategicamente e, claro, os muitos pontos de venda de bebidas.
O deslumbre pelo aparato começa aí. Mesmo antes de chegar o dia, já o anunciar do evento cria o primeiro contacto com uma espécie de alienação. Chegados os dias do festival, para além da música, que, por vezes, fica em segundo plano, o mais importante é o estar entre muitos, entre milhares. O "banho de multidão" é uma expressão que se usa muito neste tipo de eventos. E se dizemos "banho" é porque o contacto com a multidão nos limpa de alguma forma. O sentido gregário é fortíssimo. E hoje mais do que nunca. Os homens têm percursos cada vez mais individualizados, solitários, cuja comunicação é muitas vezes uma ilusão. Precisamos de ver, de passear por entre a diversidade. Precisamos de pertencer a essa diversidade, a essa multiplicidade. Precisamos de existir, mesmo que a multidão não nos conheça, só o conseguimos perante os outros, no olhar dos outros. Mas os milhares de rostos que atravessam o nosso olhar nesses dias, impedem que nos concentremos apenas na música. Mesmo que seja efémero e ilusório, os festivais criam, de certa forma, um sentido de pertença. Agora e no futuro...
- Sudoeste de 2001 diz-te alguma coisa?
- Então não me diz, foi lá que conheci o Micha e a Peggy e fiz a minha primeira tatuagem.
- Aquilo é que era curtir!

Em Portugal, Verão rima com Festivalão. Foram mais do que quarenta, sim quarenta, os que contei num DN da semana passada: há festivais para todos os gostos e em simultâneo, já que o Verão é pouco tempo para tanta música. Como dizia, desde o Jazz, ao Rock, passando pela música clássica, a World Music e mais todo o tipo de Music que se possa imaginar, o Verão é nosso! Preparem-se as mochilas e as carteiras que a festa vai começar e este ano com os espectáculos de futebol até vai começar mais cedo! Para muitos a ida aos festivais é o modo de vida no Verão.
Pelo menos duas razões têm que estar na base do excesso de festivais: isto dá dinheiro e os portugueses ( e os estrangeiros) gostam das coisas que os alienem. No Verão tornam-se os peregrinos de palcos. Tanta gente numa só direcção têm que estar em sintonia e a prestar um culto qualquer. Prestam culto a quê?
Está toda a gente no mesmo barco. Até já há apoios financeiros à realização de festivais lançado pelo Ministério da Cultura / Instituto do Cinema e Audiovisuais e Multimédia de acordo com a portaria 499/2004. Aposta-se em todas as frentes: o Estado, as instituições de crédito, as grandes marcas...
Porquê "festivais"? Confesso que tenho uma certa resistência à palavra. Eu que até gosto de música.


 

Pedra do Homem, 2007



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