Correio de Leitores: "Quem deve gerir a área portuária de Lisboa?"
Posted by JCG at 9/18/2007 12:06:00 da manhã"Senhor Comandante Ferreira da Silva e bom amigo
A questão do porto de Lisboa está em cima da mesa. É actual. Sobretudo, porque envolve a cidade capital, porque foi no passado o maior porto nacional e porque se polemiza se deve continuar a crescer como no passado, nas suas áreas naturais, dentro da cidade ou se deve alterar-se essa perspectiva noutra direcção. É questão que me tem obrigado a grande reflexão.
Não tenho ideias definitivas e, sobretudo, aceito os argumentos que racionalmente, com substância, sustentem factos ou propostas objectivas.
Não vou argumentar… mas quero considerar dúvidas e questões.
Neste caso, porque desde que tive a possibilidade de o conhecer sempre o percebi com grande senso e equilíbrio. Também, não quero entrar em polémicas fundamentalistas e emotivas. Por isso me dirijo a si no seguimento do seu breve texto. Porque me parece ser emotivo na linha do que se fez e no seguimento do que deve continuar...
Não me parece assim. Devemos colocar interrogações e eu tenho muitas. Tanto mais porque entendo que os portos em Portugal e naturalmente o sistema portuário nunca existiu como deveria ter acontecido a partir de certo momento. Quando a realidade dos portos na Europa se alterou. Quando a Espanha olhou para os seus portos de forma pragmática, mas atenta à evolução. Nós mantivemos a tradição e a emoção. Não é desta forma que conseguimos competir num mercado internacional cada vez mais agressivo e competitivo.
Com isto não estou contra o porto de Lisboa. Entendo, contudo, há mais de dez anos que muitas coisas já deveriam ter sido alteradas. Para isso, também é necessário ter espaço para com bom senso e serenidade podermos discutir.
Portugal é um país periférico (La Palisse já sabia!). É um país com um volume de cargas relativamente de baixa elasticidade e fraco crescimento. Mas Portugal é um país cuja economia é muito influenciada pelas mercadorias importadas pelos seus portos. Ou seja, o valor destas mercadorias influencia negativamente a competitividade da economia nacional quando comparada com as economias europeias e outras. Este facto centra a necessidade e dimensão dos nossos portos nas necessidades de abastecimento da economia portuguesas mais uns poucos hinterlands espanhóis, até agora sem grande expressão. Repito, somos uma economia periférica que, também, se distribui por uma faixa costeira onde se localizam o mercado (ou mercados) a abastecer.
Este é um dado do problema que condiciona os portos «principais». Observe-se como o seu crescimento é lento.
Mas os portos ou algum porto pode ser «hub» ou porto de transhipment. Neste caso a sua importância não depende do nosso mercado mas da sua localização estratégica face às rotas marítimas internacionais ou tráfegos, a par da localização de diferentes mercados. Neste caso, o porto servirá para redistribuir as cargas e, por tal facto, pode ser aproveitado para que certas mercadorias possam aí acrescentar algum valor. Daí a importância das ZAL. Também deriva daí e de outras circunstancias relacionadas com indústrias de grande dimensão muito específicas as opções de localização, constituindo-se «zonas de implantação industrial» ou áreas de desenvolvimento industrial e comercial.
No caso do porto de Lisboa dir-se-á que deverá servir a industria da área metropolitana e servir a conglomeração metropolitana como mercados de produção e de consumo. Então, o porto de Lisboa deveria ser adequado para dar esta resposta como porto moderno (quer dizer, tecnologicamente apetrechado e com um sistema eficiente a custo competitivo).
Será que é este o pensamento central de quem pensa o porto? Mas que conhecimento e experiência têm do sector, em geral, aqueles que assumem a responsabilidade de gerir o porto? Que provas concretas os acompanham? Porque razão se deslumbram quando chegam ao porto de Lisboa? O que sabem de portos e do sistema portuário? Quanto tempo levam a aprender? Com quem se aconselham?
Mas, o que é hoje um PORTO? O porto deverá implicar a cidade ou a cidade deverá implicar o porto? Será que a VOCAÇÃO de um porto não é relevante? E a COMPLEMENTARIDADE de portos próximos não é essencial face a investimentos tão elevados? Quem paga esses investimentos? Que consequências implicam para o desenvolvimento atendendo ao enorme período de recuperação? Mas, a questão «mais» essencial (repito) é perceber: o que é um porto no século XXI?
Senhor Comandante, acredite que faço esta reflexão livre por estima pessoal no sentido de ajudar a reflectir sobre matéria da maior importância, cujas decisões têm efeitos profundos (positivos ou negativos) a longo prazo.
Saudações amigas
J. Augusto Felício "
Etiquetas: Cidades e Portos