A Maldição dos Recursos
Stiglitz analisa aquilo que identifica como “a maldição dos recursos”: países em desenvolvimento ricos em recursos com taxas de crescimento muito baixas e taxas de pobreza mais elevadas do que noutros países menos dotados. “Estes países em desenvolvimento, ricos em recursos, tendem a ser países ricos com uma população pobre”.
O autor analisa vários casos em que isso acontece: o Azerbeijão, a Nigéria, – “que ganhou quase um quarto de um trilião de dólares em receitas do petróleo ao longo das últimas três décadas (…) apesar de todo o petróleo, o rendimento per capita desceu cerca de 15 por cento entre 1975 e 2000, enquanto que o número de pessoas a viver com menos de $1 por dia quadruplicou de 19 milhões para 84 milhões (…) – a Venezuela, a Arábia Saudita, a Rússia, o Cazaquistão etc.
Uma das situações características destes países é a violência. A instabilidade, a corrupção, a falta de democracia, a ditadura, muitas vezes unipessoal, são traços comuns destes países, embora não um seu exclusivo. “Os governos que chegam ao poder, tomando os recursos e utilizando a força, têm um sentido de responsabilidade para com os seus cidadãos e para com os recursos do seu país substancialmente diferente daqueles que saem da vontade popular”. Stiglitz analisa depois a questão da “apropriação da Riqueza Pública”. “O primeiro desafio com que se deparam os países ricos em recursos é o de assegurar que o sector público recebe tanto do valor que se encontra nas suas terras quanto possível” Isso é difícil mesmo em países desenvolvidos, como nos EU. Os sectores dos recursos influenciam fortemente a decisão política através do suporte a campanhas eleitorais, por exemplo. Quando as empresas actuam nos países em desenvolvimento “ aí entra em jogo a total corrupção. No mundo altamente competitivo do petróleo internacional, é mais fácil para uma petrolífera apresentar lucros elevados, através de subornos a funcionários do Estado para que baixem o preço que têm que pagar, do que serem mais eficientes do que todos os outros, pagando o preço total de mercado.(…) Os subornos tanto minam o processo democrático como o mercado. No entanto, o verdadeiro problema não está nos subornos, por muito detestáveis que sejam, mas sim nas suas consequências; quando a petrolífera ganha, o país local perde.”
Outra perspectiva que o autor analisa ainda no âmbito da apropriação da riqueza pública são as privatizações. Stiglitz afirma que sempre que o Estado recebe, na venda de um bem patrimonial a privados, menos do que o valor do bem o país está a ser burlado já que aquilo que acontece é a transferência “ da riqueza dos cidadãos como um todo, para quem fica com esses bens a “preços de desconto”. Stiglitz "desfaz” o argumento utilizado pelo FMI a favor das privatizações, o da superior eficiência do sector privado sobre o sector público, largamente contrariado pela realidade. O autor dá exemplos do sector petrolífero na Noruega ou na Malásia e dá sobretudo os exemplos chocantes da Rússia e da Venezuela, antes de Chavez. Esta análise do potencial efeito nefasto da privatização dos recursos é feita em paralelo com uma outra que é a da forma como se utiliza o dinheiro da venda desses recursos.
Voltando ao caso da Rússia o autor escreve que “houve leilões públicos mas os leilões tinham sido viciados [no tempo de Ieltsin] e os oligarcas ficaram com os vastos recursos naturais do país por uma ninharia: Há funcionários do Estado que crêem que a quantia roubada excede os três triliões de dólares (…) No caso da Rússia foram russos a roubar dinheiro ao seu próprio país (…)”. No caso da Venezuela, Stiglitz não se mostra surpreendido que Chavez tenha ganho as eleições de 1988 na primeira volta, “ na sequência de uma candidatura baseada na plataforma da erradicação da pobreza” (…) A capacidade de Chavez renegociar velhos contactos, obter melhores condições para o seu país, reforça muito simplesmente a ideia de que no passado, os venezuelanos foram burlados (…)”
Stiglitz acaba este capítulo, como todos os outros ao longo do livro, com uma mensagem optimista que é afinal a mensagem que dá o título ao livro: “Tornar Eficaz a Globalização: a maldição dos recursos não é inevitável”. Destaco: “A maldição dos recursos não é uma sina: é uma escolha. Exploração dos recursos naturais é uma parte importante da Globalização, hoje em dia, e de algum modo, os fracassos dos países em desenvolvimento que são ricos em recursos são um paradigma dos fracassos da globalização (…)” Stiglitz centra-se na necessidade de não só se obter o maior valor possível pelos recursos como na necessidade de usar bem esse dinheiro. Os fundos de estabilização são analisados a partir de dois exemplos bem diferentes, mas ambos bem sucedidos: a Noruega e o Botsuana. Ambos criaram fundos de estabilização que “são essenciais para permitir que os Estados os utilizem nas circunstâncias apropriadas e especialmente para ajudar a estabilizar a economia". O autor referira anteriormente que “gastar bem o dinheiro ou gastar dinheiro no momento certo são dois dos maiores desafios com que se deparam os países ricos em recursos” recordando a doença holandesa a propósito do efeito negativo que tem sobre a restante economia – abrandamento do crescimento e desemprego por perda do potencial exportador, por exemplo – o excesso de liquidez gerado pela venda dos recursos e pela valorização da moeda.
Stiglitz acaba com uma Agenda de Acções Concretas para a Comunidade Internacional com um conjunto de sete medidas que permitirão quebrar a “maldição dos recursos naturais e fazer com que os abundantes recursos naturais tornem a ser o que devem ser – uma bênção.”


 

Pedra do Homem, 2007



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