O Presidente da República fez um discurso de ano novo claramente à esquerda do do actual primeiro-ministro e do seu Governo. Não seria dificil mas merece ser registado.
Cavaco Silva depois do elogio à presidência portuguesa da União Europeia - o único aspecto da governação que elogiou sem reservas - fez de de forma clara um conjunto de críticas a aspectos muito concretos da governação. Sobretudo a, já recorrente, crítica ao agravamento da situação de flagrante desigualdade na distribuição do rendimento - que tem aumentado com o PS no Governo como mostram as estatísticas europeias - uma crítica capaz de fazer corar um governo de esquerda. "(...)não podemos deixar de nos inquietar perante as desigualdades na distribuição do rendimento que as estatísticas revelam(...)". Mas se esta crítica gera incomodidade no Governo não se nota nada. As faces do governo não adquirem um tom rosa ainda que seja um rosa suave.
A segunda crítica mais pesada foi a relativa aos salários escandalosos de alguns gestores. "(...)interrogo-me sobre se os rendimentos auferidos por altos dirigentes de empresas não serão, muitas vezes, injustificados e desproporcionados, face aos salários médios dos seus trabalhadores(...)" O governo como se sabe a esta questão diz nada, ou melhor diz com voz de falsete: é o mercado, é o mercado, são os accionistas.
Não há mérito que explique a actual situação como referiu o Presidente.
Quanto às restantes críticas o Presidente foi certeiro na referência às políticas da natalidade associando-as ao drama do envelhecimento e do despovoamento um "problema sério do interior do País que os poderes públicos não podem ignorar." Não podem mas pelo visto ignoram ou desprezam. Daí que o Presidente perceba aqueles que não entendem qual o objectivo final de políticas como as da saúde. "(...)O acesso aos cuidados de saúde é uma inquietação de muitos Portugueses. Não estão seguros de que os utentes, principalmente os de recursos mais baixos, ocupem, como deve ser, uma posição central nas reformas que são inevitáveis para assegurar a sustentabilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde. Seria importante que os Portugueses percebessem para onde vai o País em matéria de cuidados de saúde.(...)"
No resto o Presidente da República optou por um registo em que sobre cada tema referia um aspecto positivo para depois enumerar as dúvidas as dificuldades e as perplexidades. Por exemplo referiu o crescimento da economia, os progressos no controlo das contas públicas mas acabou a referir que "o desemprego atingiu níveis preocupantes e são muitas as famílias que enfrentam sérias dificuldades para fazer face às suas despesas de todos os dias."
Cavaco sintetiza as questões - algumas das questões que preocupam os portugueses e para as quais sabe que o Governo não tem resposta ou prossegue caminhos que não conduzem a respostas aceitáveis para a maioria dos portugueses. Essas questões são as seguintes:
- Será possível reduzir a taxa de desemprego?
- Os sacrifícios da última meia dúzia de anos garantem um futuro melhor?
- Conseguirá o País aproximar-se do nível de desenvolvimento médio da União Europeia?
- Será que Portugal pode vencer?
O Presidente mostra optimismo mas define ele próprio as condições para esse optimismo. Para quem tem as oposições no estado em que se encontram, com a inenarrável liderança do PSD, este discurso é o mais eficaz discurso de oposição ao actual Governo.
Pode ler o discurso na íntegra aqui.( este blogue faz serviço público)


 

Pedra do Homem, 2007



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